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A Espanholização sob o Fracasso do Culturalismo.

 

“Se você deseja conquistar uma nação, comece dividindo seu
povo.” Já não importa quem escreveu isso, e minha falta de memória não permite
dar créditos ao autor. Talvez tenha sido Sun Tzu. Ou não.


Portanto, em tempos maniqueístas de apartheid social,
colocados devida e voluntariamente em nossos polos, assistimos as desigualdades
sociais ficarem a cada sufrágio mais evidentes.

 

Engana-se aquele que, em relação a um determinado fenômeno
social, considera-o limitado a alguns setores da sociedade, sem atribuí-lo
caráter hegemônico, integral, totalizante.

 

Trato aqui, da desigualdade social. Sim, em voga o sistema
classista, entre opressores e dominados, dominantes e oprimidos. Num país que
se permitiu chegar nesse ponto, há de se reconhecer que tal desigualdade
alcança também o esporte, em especial o Futebol. Não obstante já venha
acontecendo há tempos, hoje se exponencializa.

 

As relações obscuras entre entidades envolvidas e a lei,
seja a Maior ou a infra-ordinária, bem como as estatutárias e principalmente as
contratuais, continuam deliberadamente a enfraquecer esse esporte, por mais
paradoxal que pareça aos olhos dos favorecidos.

 

Claro que esse “sistema” não se sustentaria sem o apoio da
mídia esportiva, defensora e propagadora dos interesses comerciais e políticos
de seus anunciantes, leia-se investidores. Não estão agindo em prol do esporte,
mas sim visando a audiência, fazendo valer o paradigma do tamanho (clubes
grandes x clubes pequenos), referência ou critério absurdamente excludente para
pautar sua função comunicadora social, se é que se pode chamar assim.

 

Perguntei para um ícone do jornalismo se o amor que a
torcida do Papão sente pelo Payssandu, era maior ou menor que a da urubuzada que sente
pelo Flamengo. Sem resposta, pois não há resposta, não há argumentos, nunca
existirão respostas nem argumentos para tudo aquilo que for na contramão da
evolução da sociedade, da libertação de um povo, de sua emancipação.

 

Prevalece o silêncio, mas não é um silêncio fruto de
conscientização, é sobretudo passional, como aquele que vê a esposa sendo mal
educada no trato pessoal com uma impossível amante, sua apenas colega de
trabalho: ele cala e ponto final.

 

Esse doutrinamento midiático é uma das mais velhas formas de
controle social, dirigindo e manipulando mentes ingênuas e acríticas, nada
reflexivas, passivas ao extremo. Fale apenas de A e B, que A e B serão
consideradas as únicas letras do alfabeto. Não se incomode em formas palavras:
eles não querem ouvi-lo, por isso não há espaço para o povo de PR, SC,
centro-oeste, norte e nordeste.

 

Portanto, a dimensão dos espaços estruturais indicados por
Boaventura, se apequena, seja por omissão, ingerência ou simples reprodução dos
detentores do poder, fazendo com que o mercado se sobreponha à cidadania: a
razão é mesmo indolente.

 

E o culturalismo, essa espécie de justificativa capaz até de
relativizar costumes de povos que cometem atrocidades contra direitos humanos,
aparece no céu do desconhecimento não em sua versão clássica mundial, mas no
modo racista, no sentido de que os hábitos se concretizam ao longo do tempo
promovendo, ao sul do equador, a segregação geográfica dentro de uma mesma
nação. Dominados PR, SC, centro-oeste, norte e nordeste, somos uma variante do racismo
científico/étnico. Leia mais em Jessé Souza.

 

Afinando a contextualização, assistimos perplexos neste
início de 2019 uma progressão significativa dessas diferenças, no tangente ao
volume de investimento dos clubes de futebol e suas respectivas receitas,
proporcionalmente à situação geográfica em que se eles encontram.

 

A mídia “esportiva” tem um papel fundamental na
supervalorização de boleiros, elegendo como se fosse expert, os queridinhos da
hora, em sua maioria, meros jogadores, jamais craques de Futebol. Assim
nasceram Wagner Love e Oscar, e continuam parindo a fórceps os Paquetás e os
Dudus da vida. A capacidade alquimista dos jornalistas da bola é de fazer de
Paulo Coelho um simples ilusionário.

 

Assim, são negociados no mercado internacional, tais atletas
com status de heróis, provocando transações multimilionárias tornando o
negócio, uma atividade surreal, aparentemente lícita, mas substancialmente
imoral, quando se reporta às outras necessidades das populações mundo afora.
Lavagem de dinheiro? Pense como quiser.

 

Não bastasse o suporte midiático, a corrente televisiva
detentora dos direitos de transmissão aloca dezenas de percentuais a mais para
as ditas principais agremiações, restando a uma terceira, um patrocinador de
peso. Imaginar o retorno que uma empresa teria em investir R$80 milhões por
ano... repergunto como no fim do parágrafo anterior.

 

Sempre em detrimento dos demais, a notícia é o mercado dos
grandes, e suas loucuras financeiras. Será que não pensam naquela coisa chamada
competitividade? Por que razão não há limites de salário ou contratação de um
jogador? Quem ganha com isso? A torcida? Boleiros caríssimos são garantia de
títulos dos campeonatos? Qual o clima nos vestiários de um atleta da base que
joga mais que um famoso, ganhando 200 vezes menos que ele, e não é escalado por
causa do mercado? As perguntas vão muito além da prorrogação.

 

Então o clube A diminuiu em um ou dois mandatos suas dívidas
tributárias e trabalhistas para R$454,6 milhões de reais, fato que lhe autoriza
a pagar R$1.250.00,00 por mês para determinado jogador. Ah, mas não houve
custo, está embutido no salário. Explica-se? O que acha o goleiro reserva que
ganha 50 mil? Para um time que nem estádio próprio tem.

 

Sabemos que os valores foram invertidos. Ou melhor: há
inversão de valores. Só se fala em Flamengo e Palmeiras. Corinthians por fora.
Um círculo vicioso de noticiário excludente, tal qual eram televisionados na
década de 70, apenas os jogos de Rio e São Paulo, para o Brasil todo. Pessoas
de outros estados nasceram assistindo isso. Tiveram descendentes. Todos
ignorando até a existência dos times locais. Verdadeira alienação interna. Mas
o livre-arbítrio atesta escolhas, mesmo com a ausência de critérios, jus solis
e tais.

 

A partir desse ano, Flamengo, Palmeiras e Corinthians farão
do Brasil uma Espanha do hemisfério sul, onde apenas três equipes terão
condições de levantar os canecos. Seja pelo suporte midiático, seja pelo
patrocínio desvairado, seja pela influência nas entidades esportivas, suas
federações e arbitragens. Sim, os três são os novos e exclusivos dominantes.

 

Corremos por fora, paranaenses excluídos, com apenas um só
representante, não partícipe do sistema. A duras penas e sem o dinheiro que
desproporcionalmente favorece os poderosos com seu exército da comunicação. Esta
que atua sem produzir qualquer espécie de conhecimento, mas principalmente
reproduzindo e ampliando as forças de poder. Isso explica a ausência de
reconhecimento por parte da mídia, no CAP como instituição honesta e inovadora.

 

A tendência, caso nada se faça contra – como a criação da
liga nacional, por exemplo – é a falência dos clubes injustiçados, mais
desemprego de milhares de pessoas dependentes dessa atividade, e um troca-troca
entre os três no pódio dos campeonatos, marginalizando o lazer de toda a
população que não torcer para eles.

 

O campeonato brasileiro reduzirá paulatinamente o número de
participantes, acabando com 10 ou 8.

 

Fim da competitividade, fim do entretenimento, fim da paixão
nacional.

 

Aproveitemos enquanto não soarem as castanholas.

 

Aproveitemos enquanto houver sol.

 

Enquanto houver vento...

 













































































































 

Comentários

GABRIEL DENIS WEISS
6 anos

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Perfeito! Muito bom. Abrangente e inteligente. Mas, é preciso que a torcida compreenda e colabore para avançarmos.

BRUNO ALVES DE JESUS
6 anos

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Belo texto, quem o escreveu?

FERNANDO CÉSAR DE ANGELIS
6 anos

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Parabéns pelo texto, repleto de conteúdo e com redação perfeita. É um alerta a muito propalada pelo CAP. Sugiro elaborar também texto reduzido, com pontuações diretas para a massa rubro negra também absorver.

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