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Confira o texto de Rodrigo Bueno: “Torcedor brasileiro é o pior de todos”
O jornalista esportivo Rodrigo Bueno escreveu uma coluna, em seu blog no site do canal Fox Sports, em que analisa o comportamento do torcedor brasileiro. Para ele, as torcidas do país gostam de vencer e não de torcer.
Confira o texto abaixo ou acesse o blog de Rodrigo Bueno:
Torcedor brasileiro é o pior de todos
Torcidas de clubes brasileiros são os menos fiéis do mundo: comparecem quando o time vai bem, mas quando vai mal…
“Vou falar em espanhol para deixar bem claro o que quero dizer. Eu vejo muitos jogos pelo mundo e, na Alemanha e na Inglaterra, existem torcidas que apoiam a todo momento, independentemente do resultado. Na América do Sul, é o contrário. O time tem que contagiar os seus torcedores.”
O técnico colombiano Juan Carlos Osorio, autor da frase acima após um insosso 0 a 0 entre São Paulo e Chapecoense no Morumbi, não é a oitava maravilha do mundo, mas ele tem trazido novas ideias e debates para o futebol brasileiro. Está aprendendo e ensinando algumas coisas, inclusive a torcer. Não é novidade para mim nem para quase ninguém que o torcedor brasileiro é um dos menos fiéis do mundo. Pouco vai ao estádio e, quando vai, é tão impaciente que vaia do começo ao fim do jogo se não está satisfeito com algum jogador, com o técnico, com os dirigentes, com a posição do time na tabela ou com um desempenho não tão bom em campo. É direito do torcedor vaiar? Completamente, isso não se discute, mas há formas muito mais inteligentes e produtivas de mostrar insatisfação com algo relacionado ao seu clube de coração. Deixar o time às moscas em pequenos e grandiosos estádios ou jogar contra o time com perseguições e protestos, inclusive com a bola rolando, não rende quase nunca o efeito desejado. Infelizmente, essa é a cultura do torcedor brasileiro, que não sabe perder, não aceita simplesmente fazer uma boa campanha, não admite nem sequer um vice-campeonato.
Recentemente, recebi muitas mensagens de torcedores do Flamengo em mídias sociais questionando se eu tinha algo contra a Nação, a maior torcida de um clube de futebol no Brasil. Isso começou porque fiz um post bastante polêmico com alguma base científica mostrando que o Flamengo não tem a maior torcida do mundo. Desde então um ou outro torcedor tenta me mostrar as façanhas da imensa torcida rubro-negra como se ela fosse a melhor do mundo. Lamento dizer, mas também não é a melhor, como nenhuma do Brasil é. O Flamengo conseguiu apenas após 26 rodadas virar o time de melhor média de público do Brasileiro-2015. E qual é essa média? Pouco mais de 33 mil torcedores, o que não enche nem a metade do Maracanã.
O maior público do campeonato aconteceu em Brasília, onde uma grande, rica e carente torcida do Flamengo lotou o estádio Mané Garrincha para ver um time que vinha de seis vitórias seguidas, que estava no G4 e que sonhava até com o título do Brasileiro. Com todas essas condições, o estádio lotou e empurrou o Flamengo até a página 2. Gol do Coritiba e silêncio. Falha de César Martins no segundo gol do Coxa e perseguição ao zagueiro flamenguista, que é quem vestia o “Manto Sagrado” nos 90 minutos. Ora meus apaixonados amigos flamenguistas, você vai a campo pelo César Martins ou pelo “Manto Sagrado”? Bom, nos minutos finais, quando muita gente já tinha ido embora do estádio (cena corriqueira no nosso país quando um time está perdendo por um, dois ou dez gols de diferença), a bonita torcida do Fla, mesmo que uma pequena parte dela, grita “olé” a cada toque do vitorioso Coritiba, uma clara provocação ao… Flamengo!!! Onde está o amor? Acabou ali? Estava no Maracanã na vitória do Flamengo sobre o São Paulo por 2 a 1, e a torcida rubro-negra se manifestou de forma mais forte em quatro oportunidades muito bem definidas: quando saiu enfim um escanteio para o time aos 28 minutos do primeiro tempo depois de um início ruim da equipe, quando saiu o primeiro gol rubro-negro, quando saiu o segundo gol rubro-negro e no final do jogo quando a vitória estava garantida. A Nação não virou aquele jogo, ela cresceu na partida quando o time cresceu, na linha do que disse Osorio sobre as torcidas daqui: “O time tem que contagiar os seus torcedores”.
Mais uma vez uma dúzia de torcedores do Fluminense, creio que todos “organizados”, foi à sede do clube nas Laranjeiras protestar, tanto contra a diretoria quanto contra Fred, o maior ídolo do clube nos últimos anos. Possivelmente tenha alguma motivação política e/ou financeira nesse protesto, ainda mais porque Fred é um caso raro de jogador que compra briga com torcedor profissional e com os babacas que o policiam noite afora. “Acabou o amor, isso aqui vai virar um inferno!”. Esse grito ouvido nas Laranjeiras pelos torcedores acima citados é comum no Brasil. Quando acaba o amor de um torcedor? Quando o time fica seis jogos sem vencer no campeonato? Quando ele se aproxima ou entra na zona do rebaixamento? Quando não está no G4? Quando não ganha um título há dois anos? Oras, que amor é esse? A verdade é que há sim amor aos clubes brasileiros, muito, mas todas as torcidas do país só gostam de demonstrar isso de fato na hora boa, no momento da vitória, do título. As maiores médias de público da história do Brasileiro aconteceram quando o Flamengo foi campeão ou foi muito bem. Isso prova que a torcida do Flamengo, um retrato maior das torcidas brasileiras, enche muito mais os estádios quando briga na parte de cima da tabela.
Temos alguns casos de torcidas que quase lotaram estádios na situação inversa, torcidas de times grandes que foram em bom número a campo nas Séries B e até C (caso do Fluminense). Isso acontecia mais no passado, agora já virou modinha também times grandes serem rebaixados (o Vasco pode cair pela terceira vez). O Botafogo lidera a segunda divisão com uma média de público pequena, talvez isso explique um pouco porque o time não tem uma grande campanha como mandante nesta Série B (menos de 7.000 pagantes foram ver o empate no estádio Nilton Santos contra o Oeste mesmo num dia em que o ídolo e estrela solitária Jefferson foi homenageado por fazer 400 partidas pelo clube).
A Grande São Paulo tem mais de 20 milhões de pessoas e nem assim Corinthians, Palmeiras e São Paulo conseguem ter uma taxa de ocupação de quase 100% em seus estádios. Corinthians e Palmeiras, com arenas novas e programas de sócio-torcedor aquecidos e inflados, têm média aproximada de 30.000 pagantes por jogo. Isso parece um sonho no futebol brasileiro, mas você vai encontrar times de segunda divisão na Europa com tal média de público e com taxa de ocupação melhor. Preço de ingresso, data de jogo, horário de jogo, transmissão de TV, temperatura, transporte público, violência, fase do time… São muitas as desculpas para não ir a campo. O amor do torcedor aqui tem muitos adversários e parece ser mais facilmente vencido do que em outros lugares. Parece que o torcedor torce pela vitória, não pelo time. Osorio foi muito corajoso em tocar nesse tema numa coletiva de imprensa aqui, comprando uma briga talvez com a própria torcida do São Paulo. Mas ele está certo. Comentei no Fox Sports o jogo entre o modorrento time do Morumbi e a Chape. Especialmente no primeiro tempo o time do São Paulo não demonstrou nenhum tesão em jogar, se arrastou em campo, quase todos os jogadores ficaram estáticos em campo, sonolentos, quase que esperando o apito final para ir correndo para casa, sobraram apatia e desinteresse (e olha que Ganso nem atuou nesse jogo). Seria assim se o Morumbi estivesse com 60 mil torcedores? Aposto que não. Esses mesmos jogadores são-paulinos se sentiriam muito mais tocados a correr, a suar a camisa, a brigar pela vitória. Não é à toa que o São Paulo rende muito mais no Morumbi em jogos internacionais com grande público. A equipe ganha uma raça e uma fome que normalmente não utiliza. É um caso em que a torcida contagia o time, e não o contrário. Como seria se os 16 mil torcedores do São Paulo que foram ao Morumbi torcer contra a Chapecoense gritassem o tempo todo e empurassem o time do início ao fim? Talvez eles não mudassem o resultado da partida, mas eles dariam uma grande mostra de amor ao clube mesmo em noite em que o time estava morto em campo.
Há uma disputa um tanto quanto boboca no Brasil para ver quem tem a “melhor torcida”. Tem gente que fala que é a do Atlético-MG (Galão da Massa) por ela ser “a torcida mais argentina do Brasil”. Isso só mostra para mim que os brasileiros admitem que a os argentinos sabem torcer mais que os brasileiros. Não posso dizer que a torcida do Galo é melhor que a do Flamengo nem que é melhor que a do Corinthians nem que é melhor que a do Grêmio nem que é melhor do que a do Santa Cruz nem que é melhor do que a do Paysandu nem que é melhor do que a do Remo nem que é melhor do que a do Bahia nem que é melhor do que a do Brasil de Pelotas nem que é melhor do que a do Juventus da Mooca etc. Esse jeito brasileiro de torcer é levado também para a seleção. Aliás a torcida pela seleção nos estádios é ainda mais patética, menos paciente e bem menos apaixonada. Há torcedores no Brasil que dizem algo como “eu não gosto de futebol, eu gosto é do meu time”. Sabe o que parece na verdade? “Eu não gosto de futebol, eu gosto é de ganhar.”